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Gonzalo Aguilar sobre Fernando Pessoa


Retrato de Fernando Pessoa, José de Almada Negreiros

Por Gonzalo Aguilar*


Gonzalo Aguilar con más reflexiones sobre cine y literatura, en esta emisión: la obra del poeta y escritor portugués Fernando Pessoa.


Fernando Pessoa es el poeta portugués más importante, junto a Luis de Camoes (poeta del renacimiento). Pessoa pertenece al siglo XX y su característica especial reside en que inventó otros poetas con nombre, historia y vida. Uno de estos poetas que inventó, llamado Ricardo Reis, fue luego personaje de una novela de Saramago. Estos personajes eran sus heterónimos que escribían sobre temas muy variados, desde cuestiones del pensamiento y guías turísticas de Lisboa hasta ensayos sobre la moda. Cada uno tenía sus propias características, incluso eran muy diferentes a Pessoa mismo, con su típica poesía intimista y también muy intelectual con la idea de que el poeta finge su dolor para poder hacerlo poesía. Con este conjunto de heterónimos Pessoa tenía la idea de crear en Portugal un neopaganismo relacionado a esa crisis señalada por Nietzsche de una falta de nuevos dioses donde Occidente se había agotado en uno solo, y este dios había muerto, a lo que oponía el mundo griego y su multiplicidad de deidades.

De alguna manera Pessoa quiso crear una serie de autores que tuviesen que ver con la idea de un retorno de esos dioses de todo tipo. Uno de los poetas que inventó fue Alberto Caeiro, de una poesía bucólica y concreta al mismo tiempo, que era a su vez el maestro de Pessoa y de todos los demás heterónimos; entre ellos los más importantes fueron Ricardo Reis, poeta de estilo clásico similar a una oda latina, y Álvaro de Campos, poeta vanguardista extremo semejante a un futurismo desatado. Caeiro es un poeta que vuelve a lo básico, que desmiente toda mirada romántica y sentimentalista de las cosas; según Pessoa, vivió en el campo y murió en 1915.


O Guardador de Rebanhos - Poema X

Alberto Caeiro

"Olá, guardador de rebanhos, Aí à beira da estrada, Que te diz o vento que passa?" "Que é vento, e que passa, E que já passou antes, E que passará depois. E a ti o que te diz?" "Muita cousa mais do que isso. Fala-me de muitas outras cousas. De memórias e de saudades E de cousas que nunca foram." "Nunca ouviste passar o vento. O vento só fala do vento. O que lhe ouviste foi mentira, E a mentira está em ti."

 

Tras la muerte de Pessoa se encuentran alrededor cien heterónimos (el escritor Antonio Tabucchi dice: Pessoa deja un baúl lleno de gente) que escriben sobre los más diversos temas. Es así que Fernando Pessoa quiso construir una cultura o refundar la propia portuguesa con su propia persona y con estos heterónimos de los que era autor hasta de la biografía de cada uno de ellos. En el caso de Alberto Caeiro, de profesión maestro, su libro cuenta con dos prólogos: uno escrito por Ricardo Reis y el otro por Álvaro Campos, quienes a su vez tienen diferentes lecturas de la poesía de Caeiro.

De un modo confuso, muchas veces se ha creído que padecía algún tipo de esquizofrenia por ese modo de escritura, cuando lo que realmente Pessoa tenía era todo un programa de pensar el sujeto lírico desligado de una persona, a tal punto que decía que Ricardo Reis escribía mejor que él, que poseía una suerte de “artesanato” que a él mismo le era muy difícil de alcanzar.

El merecido reconocimiento en vida no fue algo alcanzado por Pessoa, e incluso realizó una única publicación a lo largo de su existencia llamada Mensagem, que trataba sobre lo que sucede en Portugal en la época del rey Sebastián quien volvería para refundar el reino de Portugal pero finalmente muere en el norte de África (mitos utilizados en la modernidad cuando el catolicismo ya no daba respuestas).

Lo interesante de las figuras de los heterónimos de Pessoa es que su escritura es totalmente diferente entre sí. No hay manera de darse cuenta que se trata del mismo autor. Por ejemplo en el caso de Álvaro de Campos, en un principio posee una escritura bien vanguardista que habla de las máquinas, de la excitación, que hace versos con ruidos de motores, etc. y después se vuelve un poeta más melancólico, mucho más intimista, es decir, hace un camino propio que nada tiene que ver con el de Pessoa.


Tabacaria

Álvaro de Campos

Não sou nada. Nunca serei nada. Não posso querer ser nada. À parte isso, tenho em mim todos os sonhos do mundo. Janelas do meu quarto, Do meu quarto de um dos milhões do mundo que ninguém sabe quem é (E se soubessem quem é, o que saberiam?), Dais para o mistério de uma rua cruzada constantemente por gente, Para uma rua inacessível a todos os pensamentos, Real, impossivelmente real, certa, desconhecidamente certa, Com o mistério das coisas por baixo das pedras e dos seres, Com a morte a pôr humidade nas paredes e cabelos brancos nos homens, Com o Destino a conduzir a carroça de tudo pela estrada de nada. Estou hoje vencido, como se soubesse a verdade. Estou hoje lúcido, como se estivesse para morrer, E não tivesse mais irmandade com as coisas Senão uma despedida, tornando-se esta casa e este lado da rua A fileira de carruagens de um comboio, e uma partida apitada De dentro da minha cabeça, E uma sacudidela dos meus nervos e um ranger de ossos na ida. Estou hoje perplexo como quem pensou e achou e esqueceu. Estou hoje dividido entre a lealdade que devo À Tabacaria do outro lado da rua, como coisa real por fora, E à sensação de que tudo é sonho, como coisa real por dentro. Falhei em tudo. Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada. A aprendizagem que me deram, Desci dela pela janela das traseiras da casa, Fui até ao campo com grandes propósitos. Mas lá encontrei só ervas e árvores, E quando havia gente era igual à outra. Saio da janela, sento-me numa cadeira. Em que hei-de pensar? Que sei eu do que serei, eu que não sei o que sou? Ser o que penso? Mas penso ser tanta coisa! E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos! Génio? Neste momento Cem mil cérebros se concebem em sonho génios como eu, E a história não marcará, quem sabe?, nem um, Nem haverá senão estrume de tantas conquistas futuras. Não, não creio em mim. Em todos os manicómios há doidos malucos com tantas certezas! Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais certo ou menos certo? Não, nem em mim... Em quantas mansardas e não-mansardas do mundo Não estão nesta hora génios-para-si-mesmos sonhando? Quantas aspirações altas e nobres e lúcidas - Sim, verdadeiramente altas e nobres e lúcidas -, E quem sabe se realizáveis, Nunca verão a luz do sol real nem acharão ouvidos de gente? O mundo é para quem nasce para o conquistar E não para quem sonha que pode conquistá-lo, ainda que tenha razão. Tenho sonhado mais que o que Napoleão fez. Tenho apertado ao peito hipotético mais humanidades do que Cristo, Tenho feito filosofias em segredo que nenhum Kant escreveu. Mas sou, e talvez serei sempre, o da mansarda, Ainda que não more nela; Serei sempre o que não nasceu para isso; Serei sempre só o que tinha qualidades; Serei sempre o que esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta E cantou a cantiga do Infinito numa capoeira, E ouviu a voz de Deus num poço tapado. Crer em mim? Não, nem em nada. Derrame-me a Natureza sobre a cabeça ardente O seu sol, a sua chuva, o vento que me acha o cabelo, E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha. Escravos cardíacos das estrelas, Conquistámos todo o mundo antes de nos levantar da cama; Mas acordámos e ele é opaco, Levantámo-nos e ele é alheio, Saímos de casa e ele é a terra inteira, Mais o sistema solar e a Via Láctea e o Indefinido. (Come chocolates, pequena; Come chocolates! Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates. Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria. Come, pequena suja, come! Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes! Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folhas de estanho, Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida.) Mas ao menos fica da amargura do que nunca serei A caligrafia rápida destes versos, Pórtico partido para o Impossível. Mas ao menos consagro a mim mesmo um desprezo sem lágrimas, Nobre ao menos no gesto largo com que atiro A roupa suja que sou, sem rol, pra o decurso das coisas, E fico em casa sem camisa. (Tu, que consolas, que não existes e por isso consolas, Ou deusa grega, concebida como estátua que fosse viva, Ou patrícia romana, impossivelmente nobre e nefasta, Ou princesa de trovadores, gentilíssima e colorida, Ou marquesa do século dezoito, decotada e longínqua, Ou cocote célebre do tempo dos nossos pais, Ou não sei quê moderno - não concebo bem o quê -, Tudo isso, seja o que for, que sejas, se pode inspirar que inspire! Meu coração é um balde despejado. Como os que invocam espíritos invocam espíritos invoco A mim mesmo e não encontro nada. Chego à janela e vejo a rua com uma nitidez absoluta. Vejo as lojas, vejo os passeios, vejo os carros que passam, Vejo os entes vivos vestidos que se cruzam, Vejo os cães que também existem, E tudo isto me pesa como uma condenação ao degredo, E tudo isto é estrangeiro, como tudo.) Vivi, estudei, amei, e até cri, E hoje não há mendigo que eu não inveje só por não ser eu. Olho a cada um os andrajos e as chagas e a mentira, E penso: talvez nunca vivesses nem estudasses nem amasses nem cresses (Porque é possível fazer a realidade de tudo isso sem fazer nada disso); Talvez tenhas existido apenas, como um lagarto a quem cortam o rabo E que é rabo para aquém do lagarto remexidamente. Fiz de mim o que não soube, E o que podia fazer de mim não o fiz. O dominó que vesti era errado. Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me. Quando quis tirar a máscara, Estava pegada à cara. Quando a tirei e me vi ao espelho, Já tinha envelhecido. Estava bêbado, já não sabia vestir o dominó que não tinha tirado. Deitei fora a máscara e dormi no vestiário Como um cão tolerado pela gerência Por ser inofensivo E vou escrever esta história para provar que sou sublime. Essência musical dos meus versos inúteis, Quem me dera encontrar-te como coisa que eu fizesse, E não ficasse sempre defronte da Tabacaria de defronte, Calcando aos pés a consciência de estar existindo, Como um tapete em que um bêbado tropeça Ou um capacho que os ciganos roubaram e não valia nada. Mas o dono da Tabacaria chegou à porta e ficou à porta. Olhou-o com o desconforto da cabeça mal voltada E com o desconforto da alma mal-entendendo. Ele morrerá e eu morrerei. Ele deixará a tabuleta, e eu deixarei versos. A certa altura morrerá a tabuleta também, e os versos também. Depois de certa altura morrerá a rua onde esteve a tabuleta, E a língua em que foram escritos os versos. Morrerá depois o planeta girante em que tudo isto se deu. Em outros satélites de outros sistemas qualquer coisa como gente Continuará fazendo coisas como versos e vivendo por baixo de coisas como tabuletas, Sempre uma coisa defronte da outra, Sempre uma coisa tão inútil como a outra, Sempre o impossível tão estúpido como o real, Sempre o mistério do fundo tão certo como o sono de mistério da superfície, Sempre isto ou sempre outra coisa ou nem uma coisa nem outra. Mas um homem entrou na Tabacaria (para comprar tabaco?), E a realidade plausível cai de repente em cima de mim. Semiergo-me enérgico, convencido, humano, E vou tencionar escrever estes versos em que digo o contrário. Acendo um cigarro ao pensar em escrevê-los E saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos. Sigo o fumo como uma rota própria, E gozo, num momento sensitivo e competente, A libertação de todas as especulações E a consciência de que a metafísica é uma consequência de estar mal disposto. Depois deito-me para trás na cadeira E continuo fumando. Enquanto o Destino mo conceder, continuarei fumando. (Se eu casasse com a filha da minha lavadeira Talvez fosse feliz.) Visto isto, levanto-me da cadeira. Vou à janela. O homem saiu da Tabacaria (metendo troco na algibeira das calças?). Ah, conheço-o: é o Esteves sem metafísica. (O dono da Tabacaria chegou à porta.) Como por um instinto divino o Esteves voltou-se e viu-me. Acenou-me adeus gritei-lhe Adeus ó Esteves!, e o universo Reconstruiu-se-me sem ideal nem esperança, e o dono da Tabacaria sorriu.

 

Escritores como Saramago, Tabucchi y Borges han hecho referencia a la obra de Pessoa que además cuenta con una presencia muy fuerte en Lisboa y con una estatua en su memoria en la puerta del bar que frecuentaba. Su figura marca un momento de corte muy profundo en la poesía contemporánea porque es quien muestra que el "ser poeta" no es una cuestión de una persona que se expresa o se inspira, sino que puede ocupar diferentes posiciones y diferentes voces, asumir una ficción que no es una mentira. Existe en su obra una reflexión sobre la escritura, sobre la firma, sobre la autoría. El filósofo italiano Giorgio Agamben se refiere mucho a Pessoa para analizar un aspecto significativo de la contemporaneidad: la posibilidad de la despersonalización, la posibilidad de hablar por otro, hablar como otro, aunque ese otro no exista. También Juan Gelman recibe su influencia en su desarrollo de los heterónimos y otro fanático de Pessoa era Fogwill.

La idea de paganismo es la que Pessoa despliega en toda su escritura, como por ejemplo en el libro El regreso de los dioses de un filósofo llamado Antonio Mora y en el clásico Libro del desasosiego bajo el heterónimo de Bernardo Soares. Componen su obra casi cuarenta tomos de temática variada de este baúl que no termina y que lo convierte en uno de los grandes genios del siglo XX. Existe un Pessoa nacionalista y otro cosmopolita que vivió en Sudáfrica, que escribió en inglés y francés. En esta multiplicidad de caracteres no es posible delimitar qué incluye y qué no su propia obra.


*Columna sobre cine de la emisión radial del 30/03/2017 de La luna con gatillo

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